Você se vê, então, numa cilada. Quase imperceptível, eu diria. Mas daí vem aquele pesar, aquela sensação de não querer largar, mas desejar tanto ir. Aquele gosto de medo na ponta da língua, medo esse tão fugidio. Vem aquilo que não se sabe ao certo, mas é íntimo demais e profundo demais pra ignorarmos. Foi você quem construiu a cilada, não foi? É você quem pode e deve desarmá-la. As previsões nunca são perfeitas, são apenas reflexos de nós mesmos, essas matérias imprevisíveis com sentimentos previsíveis mas que relutamos em admitir. E se admitir ajuda alguma coisa, admitamos. Mas pegue essa confissão e faça dela uma arma. Nesse caminho há muito perigo e estamos falando de uma cilada realmente perigosa. Use sua arma para arrancar agora a semente que vai ser a raiz do mal. Do desgosto de matar algo antes que nasça, aprenda, é uma lição para a vida toda. Depois de cair em tantas armadilhas, você aprende a reconhecê-las e, por favor, não seja burro: você não consegue descê-la e subir sem se machucar. Há muitos galhos e espilhos e lama tentando te impedir. Então aprenda agora a saltar. Você é leve, não será um problema, basta não olhar para baixo. Bem sabes que lá no fundo há quem precise, mas não de você. Mas você tem isso que alguns chamam de altruísmo. Sim, você se dá ao sacrifício. Então me faça um favor, não olhe para baixo, não dê uma de salvador, ao fim eles se salvam de algum modo, isso não lhe interessa; o que lhe diz respeito é cuidar dessa sua vida infeliz, pois sabes, não há alguém para salvar você. Nunca houve. Os sacrifícios foram todos em vão, embora você relute em admitir isso. Existe algo que não se pode ignorar, meu amor, é que um preço há de ser pago. Você não tem mais reservas, tome cuidado, se você arriscar demais não restará nada para ser salvo.