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16.9.10

Permita

Quero mais aqueles dias em que o choro, seja alegre ou triste, salga de lágrimas a língua que anseia pelo doce, o doce que me invade enquanto seus olhos me olham e eu olho tua alma. Há aquele amargo, aquele enjoo de te ver tão de perto, tão por dentro, te ver tão você, finalmente. O sabor que se mistura, a saliva que escorre, a azedo que é estar assim espremendo entre os dentes nossos medos e desejos, o passado e o futuro - o presente que não é mais, perpassa a cenatempoespaço de modo que não sinto, o presente maior que me é dado: não sentir o presente.
Quero mais o mistério, aquele de aspirar o teu hálito enquanto param os segundos, pairam, suspensos na atmosfera que criamos para sermos a fonte de nós mesmos; aquele momento em que hesitamos, em que a língua procura na escuridão total dos sentidos outra perdida nessas bocas secas, amargas, salgadas.
Quero mais a dança dos sentidos, a invasão, a perfuração, inundação da boca, da pele, dos olhos, da mente, da alma. Enche, enche de sal, saliva, açúcar, suco, lágrimas, brilho, tudo, mas enche. Se permita encher, permita ser e preencher. Só permita.

Um comentário:

  1. Esse sabor amargo-doce dos mistérios, de enxergar tão por dentro, é, pra mim, nostalgia. Essa dança dos sentidos é memória, ou repleta de pontos finais, sem prosseguimentos. Mas compartilho a sublimação desse sentimento que está em tuas mãos, ou em tua boca. Permitir-se é inevitável, aposto. Não desejo um pedaço de sorte, porque não se sabe se isso depende dela, mas tudo que depender, que seja bem-sucedido.

    :*

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