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7.11.10

winter garden

Te olho agora daqui de cima. Me pareces bem. Não necessitas mais olhar pra trás, olhar-me com olhos que imploram por um tanto de cuidado, de carinho. Consegues mover-se sem me consultar se é seguro seguir em frente. Estás curado, finalmente, não estás? Eu continuo a te observar daqui. Enquanto o sol se põe, você desabrocha diante das estrelas e a Lua; ela que vem logo ali e te espera - sim, ela te espera. Como eu te esperei tanto tempo, és ansiado por outras mãos, outros cuidados.
É preciso te deixar ir? De verdade? Me desculpe, mas me apeguei. Tive por ti tanto cuidado, tanto afeto...quis tanto que sobrevivesse; e você sobreviveu. Agora que posso fazer se as feridas sararam, se podes se guiar sem mim? Devo te deixar, outros cuidados são necessários e...vou sentir falta, juro.
É preciso lembrar do meu jardim. Enquanto cuidava de ti eu o deixei de lado, mas devo agora voltar-me aos outros, meus outros cuidados e carinhos. No fundo você e eu sabíamos que seria assim, não? Não poderíamos ser pra sempre...eu estava aqui pra te curar. Estou aqui pra curar apenas. Agora vai, vai que há novas mudas, alguns feridos, outros ressecados, peciso agora dar-lhes atenção. No fundo eu mesma sabia que não poderia ir contigo. Tem muito a ser feito aqui.
Vai logo, mas volta. Volta que o inverno é nossa época. Volta que eu não te ensinei outra forma de aquecer que não fosse nos meus braços. Vai agora que é primavera. Há muito pra você lá fora. E a andar eu te ensinei bem, sabes achar o caminho de casa. Te prometo não pensar muito, sei que voltas. Agora eu vou que o sol já nasce e com ele começo esta nova estação, sem você. Não achavas que era fácil cultivar tão vasto jardim, não é? Vai, mas volta, eu estarei aqui ainda, no meu jardim que é também teu, nosso jardim que é pra sempre no inverno.

4 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. A vida de anjo, de salvador, é também uma vida de viajante. Para, cura, as vezes não abandona, mas é abandonado. Como se fosse resposta para uma pergunta inquietante, finda o problema e, com ele, a solução. O que sobra muitas vezes nem é gratidão, porque os curados, frequentemente, nem se incomodavam com a própria doença. O que sobra é bastante pessoal, é a consciência de estar fazendo um mundo melhor.

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  3. Muitas vezes, a doença é a própria cura, eu sei, já passei por isso.

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  4. Que lindas as suas palavras, a sua forma de curar e em seguida esperar secarem as feridas que talvez nem tenham sido abertas por você. Que seu jardim de inverno floresça muito, e sempre. E que os que se afsatarem, voltem nas suas estações, para você fornecer-lhes o mesmo calor e atenção de antes, ou mais. Coincidentemente, tenho sentimentos parecidos nesse exato momento, rs. Mas agora não mais estranho que suas palavras se encaixem comigo, já aprendi a me acostumar.

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